quinta-feira, 30 de maio de 2013

O OUTRO GLAUBER EM FOCO

por Antônio Athanazzio, Bruna Esteves e Érica Fernandes



“Eu sou um apocalíptico que morrerei cedo... Às vezes sinto-me louco e absolutamente feliz dentro de uma infinita solidão.” 

(Paris, 1973)



Na última segunda-feira (27) e também na terça (28), aconteceu na Universidade Jorge Amado, na Paralela, o simpósio 'Glauber em Foco'. A ideia do projeto foi discutir e trazer a imagem do cineasta Glauber Rocha para perto do povo. A iniciativa foi da Coordenação de Comunicação Social e do Grupo de Iniciação Científica Modos de Produção Audiovisual na Bahia, coordenado por Ceci Alves. 

“As pessoas precisam assistir aos filmes e entender que a estética de Glauber é bem brasileira", declara a professora Ceci Alves, uma das organizadoras do evento. 

Ceci Alves - organizadora do 'Glauber em Foco'

Programação

Mesa 'Quem é Glauber'
Carlinhos Marques, Oscar Santana, Ceci Alves e Roque Araújo
No primeiro dia, foi exibido o curta-metragem 'O Pátio' (1959), primeiro filme de Glauber, de 11 minutos de duração, seguido do documentário de Roque Araújo, 'No Tempo de Glauber' (1986). Os convidados que fizeram parte da mesa “Quem é Glauber” foram Oscar Santana e Roque Araújo, para falarem sobre a vida e  a obra do cineasta

"O caminho do cinema são todos"
Oscar Santana fez um belo discurso em homenagem a Glauber, frisando  que "não fala do mito, e sim do amigo que começou a fazer cinema na mesma época".
Várias passagens de sua vida foram relembradas, desde a época de Glauber no Colégio Central (local onde ele estudou e desenvolveu sua criatividade) até sua consolidação como diretor e cineasta. Citações de frases emblemáticas durante sua breve vida enriqueceram e deram mais emoção ao texto, fazendo com que a plateia refletisse sobre a importância do cinema para a cultura brasileira. "Mostrar o homem para o próprio homem. Assim tudo paira no ar como um brilho interrompido". 

Oscar Santana em discurso na mesa 'Quem é Glauber'

O encerramento do primeiro dia ficou com o pocket show "Universo Baianês", com a participação do maestro Carlinhos Marques. 
Painel produzido pelos alunos da Unijorge


Já na terça-feira teve a exposição do painel 'O Olhar de Glauber Rocha no Cinema Atual', criado pelos alunos de Iniciação Científica da Unijorge e, também, um segundo painel, criado pelos alunos do grupo de pesquisa da Universidade Federal da Bahia – com orientação da Profª. Drª Marise Berta. 

Além disso, foi exibido o filme 'Terra em Transe' (1967), às 15h, para uma posterior análise da estética e técnica do filme e sua influência na cinematografia e cultura baiana, brasileira e mundial. Convidado: Adalberto Meireles. Na noite de terça foi realizado um debate  "que constituiu a obra e a visão de mundo de Glauber e como ele influenciou o mundo". Convidado: Umbelino Brasil.

Em seus filmes, o diretor consegue problematizar a ética e a estética do cinema nacional e regional, colocando em questão principalmente a pobreza, o sertão e os excluídos, sem tratar do tema com clichês. Até aí é tudo que sabemos, somado ainda ao temperamento explosivo do diretor. Contudo Glauber  escreveu cartas e roteiros que não foram publicados, era um sujeito brincalhão e tirava onda com todos nos set de filmagem. “Politicamente Glauber era uma fera. Mas enquanto diretor ele era um sujeito divertido e muito animado”, relembra Roque Araújo, um senhor elegante e muito prosaico que chegou contando várias histórias do cineasta, além de apresentar todo o acervo que ele ainda possui. “Muita coisa ainda não chegou ao grande público”, comentou. Roque falou do acervo com mais de 1.185 peças cadastradas que se encontra na Biblioteca Central que fica no bairro dos Barris.

Estudante do curso de audiovisual, Evelyn Brito
Muitos estudantes do curso de comunicação e produção audiovisual estavam presentes nesse encontro. “Estou bastante eufórica para ouvir Roque Araújo, o vovozinho mais querido do cinema. Quero entender mais sobre o trabalho do Glauber”, comenta a estudante do 3º semestre de audiovisual, Evelyn Brito, antes de entrar no auditório. 
Para Enio Sena, que está no 1º período de produção visual, a figura do Glauber não é tão conhecida assim. Apesar de já ter assistido a “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, um dos filmes do cineasta, ele conta que precisa de aprofundamento. “Não sei muita coisa da vida dele, vou aproveitar essa oportunidade para pesquisar outras obras do Glauber”, declara. 

Plateia durante evento 'Glauber em Foco'

História

Cena do filme 'Deus e o Diabo na Terra do Sol'
Glauber Rocha dirigiu 17 filmes (entre longas, documentários e curtas), escreveu 12, produziu 11 e ainda se deu ao trabalho de atuar em cinco fitas, sempre com o mesmo mantra: "uma câmera na mão e uma ideia na cabeça". O talento foi logo percebido pela mãe, Dona Lúcia, que vendeu todo o patrimônio para custear e apoiar as empreitadas cinematográficas do filho. 

Foi à falência, mas não em vão. Glauber descansa como ícone nacional e como representante máximo de um movimento fundamental na identidade da cultura brasileira: o Cinema Novo. Com influências do neorrealismo italiano e da Nouvelle Vague francesa, o manifesto foi contra às produções inflacionadas e escancarou um país subdesenvolvido e repleto de mazelas sociais, inaugurando uma busca por um olhar social (cinematográfico) que perdura até hoje.

Bate-papo com Roque Araújo

Ele chegou de repente, falante e cheio de sorrisos, disponível para ser entrevistado antes de sua participação na mesa 'Quem é Glauber'. Falar sobre o amigo é uma grande honra para este homem que trabalhou e conviveu com o grande nome do cinema baiano. Roque Araújo hoje integra a equipe da DIMAS (Diretoria de Audiovisual da Fundação Cultural do Estado da Bahia), que contribui para o fortalecimento da produção audiovisual no estado. Com mais de 50 anos de cinema no currículo, Roque concedeu a entrevista abaixo em clima alegre e saudosista.

Como foi o começo do seu trabalho com  Glauber?
De eletricista passei a assistente de câmera e prossegui como assistente de direção e diretor de fotografia. Trabalhei em todos os filmes de Glauber Rocha, menos no curta O Pátio. Com as sobras de A Idade da Terra (1980), que Glauber deixou pra mim, fiz  No Tempo de Glauber (1986), uma espécie de making of e painel grandiloquente sobre o último filme do diretor de Deus e o Diabo na Terra do Sol.

Como foi trabalhar com Glauber Rocha?
Normal, um senhor simples. Glauber era um sujeito  brincalhão. Fazia piadas, brincava com toda turma da filmagem.

E politicamente como ele era?
Ah, politicamente ele era uma fera. Ele tinha orgulho em mostrar aquele cinema com a cara do povo. Mostrava  de um jeito revolucionário.

O Cinema Novo surgiu em que momento?
Em 1955, o diretor Nelson Pereira dos Santos exibiu o primeiro filme responsável pela inauguração do Cinema Novo. “Rio 40 graus” oferecia uma narrativa simples, preocupada em ambientar sua narrativa com personagens e cenários que pudessem fazer um panorama da cidade que, na época, era a capital do país. Então tudo começa aí e depois vem Glauber e tantos outros.


Qual é a dica que o senhor dá pra  essa moçada que vem produzindo filmes com novas tecnologias e um novo jeito de fazer cinema?
Hoje em dia tudo é mais fácil, antigamente os equipamentos eram pesadíssimos. Com novos recursos tudo ta moleza. Quando eu encontro com os jovens me sinto jovem também. Agora eu aprendo com eles.


Cartaz do evento
Programação do evento



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